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Temos a necessidade de não esquecer as nossas orientações de base para prevenir futuros problemas de álcool, drogas ou outros e para não perdermos de vista quem somos e de onde viemos. Não somos perfeitos e muito menos seremos sumidades no campo espiritual.
Somos adictos que encontramos uma solução para os problemas da vida. Trata-se de uma  solução prática para um estilo de vida nada pratico. E, se esquecermos as orientações de base, deixarmos de por em prática o nosso programa, deixarmos de frequentar as reuniões de auto ajuda,  ficaremos expostos a todo o tipo de sublimações idealistas e de ilusões irreais. Estas situações poderão impedir-nos o caminho para a recuperação. Temos então de simplificar todo o processo na procura da limpeza e sobriedade e estar gratos por sermos merecedores de uma nova oportunidade onde o ponto de partida é termos conhecimento do sítio para onde não queremos ir. 
Um adicto com medo quanto baste e grato nunca recai.
Este é um tópico essencial para o desenvolvimento humano e crescimento pessoal. 
Em termos terapêuticos, a motivação é um impulso que direcciona as pessoas a atingirem determinadas metas. É, por um lado, o mecanismo responsável por iniciar, direcionar e manter comportamentos com base nos objectivos propostos, e por outro lado, faz com que os adictos dêem o melhor de si e impulsionem os restantes elementos a fazerem o mesmo.
Os estudos mais recentes, chamam à atenção para o desenvolvimento da auto-motivação ou motivação intrínseca, referindo que após o desenvolvimento que algumas ferramentas emocionais, cognitivas e sociais, é atribuído ao sujeito um papel ativo em manter comportamentos congruentes com as metas estipuladas. 
No tratamento dos comportamentos aditivos, a motivação deve ser um elemento trabalhado intensivamente, promovendo através da força interior de cada um, a disponibilidade real para atingir a meta da Recuperação.
Para muitos de nós, manter um estado de sanidade normal foi sempre uma questão de vida ou de morte. Alguns levam um bocado mais de tempo do que outros para sentirem tal necessidade. Os  sintomas da nossa insanidade dão provas de que somos  diferentes. Não obstante queríamos provar que de uma forma ou de outra conseguíamos atingir o objectivo em vista.
 
Tentávamos provar de que de uma certa forma, este programa não era a única solução disponível para os nossos problemas. E fomos tentando de tudo enquanto as nossas vidas estavam por um fio. A nossa insanidade por vezes atinge o extremo e nada conseguirá restabelece-la a não ser um plano que implique um despertar espiritual. Isto só é possível se vivermos num mundo isento de produtos alteradores da mente. 

Desenvolvendo-nos a nós mesmos

Enquanto adictos em recuperação temos de nos convencer, no mais profundo dos nossos corações que estamos a construir um ser humano melhor. Isto exige que apliquemos os nossos melhores esforços e ideias. Conseguiremos aplicá-los pela entrega da nossa vida ao grupo que nos suporta e ao programa que adoptamos. Eles guiar-nos-ao se lhos pedirmos com sinceridade. 

À medida que desenvolvemos as nossas personalidades, iremos aperceber-nos de que a nossa contribuição para a vida, é muito mais do que o afastamento dos produtos químicos que alteram a mente. Amamos e ajudamos os outros ao pensarmos, sentirmos e actuarmos maduramente em todas as situações de forma a transformarmos-nos numa pessoa melhor. 

Desta forma teremos que interiorizar que a nossa nova vida não está simplesmente a regressar do passado mas também a desenvolver-se em direcção ao futuro. Este é o nosso plano para o nosso desenvolvimento pessoal que dia a dia poremos em prática.

Artigo de opinião da Médica psiquiatra Dra. Vanessa Marsden, formada pela Universidade Federal de Uberlândia, Brasil e Mestre em Psiquiatria e Saúde Mental pela Universidade do Porto, Portugal.

Parabéns à RAN -  a trabalhar para a recuperação.

Em primeiro lugar gostaria de parabenizar a RAN (Recuperação de Alcoólicos e Narcóticos) e sua equipa pelos mais de 20 anos de sucesso no tratamento da toxicodependência em Portugal. Longe de fazer propaganda, o texto abaixo é para elucidar como trabalha a clínica e talvez estimular abordagens semelhantes no Brasil. Infelizmente no país, a maioria das clínicas de reabilitação são baseadas em trabalho duro (na enxada mesmo) e muita religiosidade (conversão evangélica). Não quero dizer que este tipo de abordagem não funciona, mas que alternativas embasadas teoricamente, mesmo que privadas, como no caso da RAN, são sempre bem vindas. O texto abaixo é um resumo de um artigo meu publicado na Psychiatry Online. As fotos da clínica foram tiradas pela equipa. Em 2005, após terminar minha residência médica em Uberlândia – MG, recebi uma proposta de trabalho em Portugal e a oportunidade de experienciar outras formas de abordar a toxicodependência. Além da vivência em outras abordagens (políticas, sociais e culturais), o trabalho que desenvolvi no país por 3 anos foi baseado em heroinômanos, uma dependência química que, por enquanto, é praticamente inexistente no Brasil. O convite que me foi oferecido veio de uma comunidade terapêutica privada, na cidade de Vila Real, em Trás-os-Montes. A clínica obedece o Modelo Minnesota de tratamento da toxicodependência, ainda pouco conhecido no Brasil. Este modelo varia de instituição a instituição, mas todos partilham os princípios fundamentais do programa 12 Passos dos Alcoólicos Anônimos (AA), criado em 1948 (Bodin, 2006). Na década de 1960, o modelo foi expandido para englobar também usuários de outras drogas (Spicer, 1993). O modelo foi trazido a Portugal em 1987, pela Unidade de Tratamento Intensivo de Toxicodependências e Alcoolismo (UTITA), do Serviço de Utilização Comum das Forças Armadas Portuguesas e daí se expandiu, com diversos centros de tratamento espalhados pelo país. Com base em seu conteúdo, os 12 passos podem ser agrupados em passos decisivos, passos de ação e passos de manutenção (Makela et al., 1996). Os passos decisivos (1-3) envolvem o reconhecimento da impotência perante as drogas e a necessidade de ajuda, e a decisão de se colocar nas mãos de um Deus pessoal. Os passos de ação (4-9) envolvem escrever e compartilhar um inventório moral, buscar a resolução de defeitos de caráter através de um Deus pessoal e consertar o mal feito a terceiros. Os passos de manutenção (10-12) são de continuado auto-exame e correção, de aprofundamento na relação com o Deus pessoal através de preces e meditação, e de levar a mensagem do programa a outros usuários de drogas. A estrutura e conteúdo do tratamento O programa da comunidade terapêutica constituí-se em 84 dias de tratamento inicial, em setting residencial, seguido de 6 a 24 meses de acompanhamento pós-alta. Formada há 24 anos, a comunidade terapêutica é a base de toda estrutura, com capacidade para  mais ou menos 20 utentes.  A equipe inclui clínico geral, psiquiatra, enfermeiro, psicólogos e conselheiros, sendo alguns dos últimos toxicodependentes recuperados através do AA ou NA. Baseado nos princípios do AA/NA, o grupo terapêutico é considerado a principal arma terapêutica, fornecendo um local para identificação com outros em situação semelhante. Sessões em grupo podem tomar a forma de grupos para solução de problemas, direcionados a problemas pessoais específicos, ou sessões de confrontação, direcionadas a “destruir a negação” do paciente. Ensaios sobre a “História de Vida” e outras consequências negativas do uso de drogas são relatados na terapia de grupo. Outros tipos de grupos incluem grupos diários de leitura, nos quais os pacientes fazem reflecções ou meditações sobre a literatura do NA ou AA; palestras diárias sobre tópicos relativos aos programas e tradições do NA, desde a natureza da dependência química, conceptualizada pelo modelo de doença, à consequências médicas, psicológicas e sociais do uso de substâncias. Programas familiares são incluídos, às quartas-feiras, sob a premissa de que a dependência química é uma doença que afeta negativamente todos os membros do núcleo familiar. Finalmente, atividades físicas e passeios aos fins-de-semana são oferecidos à todos os internos. O esquema de tratamento diário geralmente contém quase todos esses elementos e, em consequência, é altamente estruturado. O acompanhamento pós-alta pode incluir atividades individuais regulares, aconselhamento em grupos ou famílias e a presença em reuniões do AA ou NA é mandatória.